terça-feira, 5 de junho de 2012

“De Mutante virei Os Quem!”

19 de outubro de 2010. Era aniversário de Jonas, que completava catorze anos. Como presente, seu pai havia prometido um vinil, na condição de ser comprado pelo menino. Apesar de achar uma velharia, e nem entender muito o porque daquilo (afinal, pensava: “Carregar uma bolacha enorme preta se eu posso ter tudo no bolso em mp3?”), achou a proposta interessante. O motivo: era a primeira vez que sairia absolutamente sozinho, em direção ao centro de São Paulo, na condição de cumprir a missão de retornar com um disco em baixo do braço. Era uma terça-feira. Jonas sairia da escola e caminharia direto para a Galeria Nova Barão e assim o fez. Seu pai havia lhe dado um mapa com instruções para a chegada e ao termino dela, estava escrito: Liberte a sua imaginação. O caminho até a Galeria, para Jonas, era como uma aventura. A cada passo pela cidade, o jovem ia se sentindo mais forte e invadido por uma alegria atrelada a liberdade. Imaginou que dali viria o pedido do seu pai, aquele anotado, uma vez que o visual do centro não costumava lhe provocar esse efeito. Chegando, entrou em uma loja chamada “Big Papa’s”. Inicialmente, aquela organização de vinis não provocou nenhum entusiasmo ao garoto. Em um segundo a história se alterou: reconheceu uma foto na parede (que definia uma sessão de discos). Eram “Os Mutantes”, com Rita Lee vestida de noiva. Tinha como separação então a banda favorita de seu pai, chegando a conclusão que era ali que encontraria o presente. Após passar por aquelas relíquias (velharia, na cabeça dele), encontrou uma capa que o atraiu. Em branco e preto, era um menino, de costas, sobre uma moto. Descobriu que era da banda “The Who” (“quem?”, pensou, dando um leve sorriso, lembrando das aulas de inglês). Colocou o disco na vitrola, vestindo os fones ali plugados e sentando em uma poltrona vermelha que ficava ao lado. Nos primeiros segundos que o vinil começou a rodar, Jonas admirou aquele encarte e no mesmo instante, uma ventania invadiu a loja. Ele se levanta e começa a ver a transformação de tudo em pó, com o vento ainda mais forte, o impossibilitando de enxergar qualquer coisa. Em segundos encontra-se em uma rua escura, vazia, com apenas um moto “Lambretta” branca, recheada de espelhos, a sua frente. Começou a admirar toda aquela paisagem, achando-a estranha e diferente. Um menino loiro, sobre uma moto igual a outra parada ali, mas essa vermelha, aparece em sua frente e diz: “Vem logo, Jimmy! Sobe logo que a gente tá atrasado!”. “Jimmy?”, pensou Jonas, mas sem conseguir perguntar absolutamente nada, pegou a moto e seguiu o garoto. Pararam em uma casa e entraram. Jonas não dizia uma palavra, apenas o seguia. Ganhou então umas “balas” do loiro, que as chamou de anfetamina. Colocou-as em sua própria boca, sem pensar sobre o que estava fazendo. Acreditou que havia tomado parte do corpo do tal Jimmy, mas as atitudes e costumes desse garoto havia habitado o Jonas que conhecia. Era então uma mistura. Estavam em uma festa. O jovem começou a reparar na decoração e vestimentas estranhas a ele. Trajava terno justo e gravata. Nunca tinha vestido isso. Era tudo novidade. A música também não era o que conhecia, reparou a repetição de “Talking about my generation”, e entendeu que alguém falava daquela geração. Qual era ela? Virou para a garota ao lado e perguntou: “Em que ano estamos?”, ela, com cara de espanto, respondeu: “1965!”. Um estrondo distrai qualquer interação da festa. Jonas, Jimmy, ou sabe-se lá o que ele era, vê três garotos vestidos com jaquetas de couro, parando suas grandes motos sobre as lambretas estacionadas. Uma briga começa: meninos “enjaquetados” contra aqueles que vestiam ternos justos e gravata. Os últimos, em maioria, vencem o duelo. Resultou na corrida em fuga dos com jaqueta e suas motos. Todos que estavam na casa saíram dela gritando: “Nós somos os MODS! Nós somos os MODS!”. Jonas foi então saindo da casa, seguindo todas aquelas pessoas que gritavam. Pensava se ser “Mod” era ser como Jimmy e todos aqueles jovens que pareciam ter entre os seus dezessete anos, ou mais, ou menos. Uma nova ventania começa, tudo se transforma em pó, novamente, com a repetição da visão afetada. Era tudo de novo. Onde ele pararia agora? O garoto se depara sentado na mesma poltrona de antes. O disco agora não tocava mais, girava em vão na vitrola. Um homem, no balcão, o diz: “Vá para casa, vire o disco, e continue sua viagem”. E foi exatamente o que ele fez. O retorno com o disco “Quadrophenia” em baixo do braço foi tranquilo. Ao abrir a porta, depara com o seu pai, que diz: “E ai, filhão. Como foi o passeio?”. Ele o olha e responde: “Um simples passeio pela imaginação histórica. Descobri que entre ela e a música não existe velharia!”. O jovem dá um sorriso e sobe pra o quarto, colocando logo o disco para continuar a tocar.

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