quinta-feira, 19 de julho de 2012

Aquilo que passou. Aquilo que nunca existiu.

Olhava para um vídeo de Alice no País das Maravilhas, na realidade apenas a caixa dele, aquele da Disney, de 1951. Era a capa de um desenho que me levou de volta para a casa da minha avó paterna, na primeira metade dos anos 90. Uma saudade, em partes estranha, atingiu-me em cheio no peito. Me lembrou tardes e quadros, eram desenhos que ela mandava emoldurar com o maior orgulho da neta, a “princesinha da vovó”.
 Toda tarde que passava em sua casa necessitava de um ritual. Primeiro, desenho animado no meu quarto – um quarto de tv do apartamento, que eu chamava de meu. Depois, “pintavamos” telas no atelier dela. Custei para sujar a primeira, só a conquistei por volta dos meus cinco anos, e, diga-se de passagem, foi gloriosa. No fim da tarde, era sempre a mesma história: admirar bem-te-vis pela janela do apartamento, que me divertia ao responder para os passarinhos.
 Acho que essa convivência possivelmente tem uma relação no fato d’eu me contruir como uma pessoa sozinha, principalmente antes dos meus quinze anos. Filha única, neta única (no que trato aqui), amadurecimento único. As tardes com a minha avó me mostram hoje o quanto influenciaram na minha criação. A dificuldade em fazer, ou manter, amigos só foi superada no colegial. Na realidade, a utilização da palavra “superada” me parece um tanto fora de contexto, uma vez que aqueles que eu não consegui me apegar até aquela época não me fizeram ou fazem falta alguma, afinal, eu tinha muito mais do que eles poderiam montar.
 Às vezes me deparo com a falta da solidão que tinha nessa época. Querendo ou não era um estado reconfortante. Foram nesses dias que descobri uma paixão por música, quando larguei um desenho da Betty Boop pra assistir uma solista tocar Pagannini com o meu pai. Ou um gosto pela leitura, quando contava “Feiurinha”, do Pedro Bandeira, de trás para frente. Era o tempo em que todos diziam que eu lembrava o meu tio André, irmão do meu pai, que eu não cheguei a conhecer.
 Foi então por um trauma que tenho até hoje com o formato do meu nariz que soube um pouco sobre o meu tio. Minha mãe fazia comparações físicas, meu pai evitava qualquer comentário, mas nunca deixou de lembrar a adoração a coca-cola, e o fascínio por rock e desenhos que o seu irmão tinha. Já a minha vó acabava comparando-me por um estado de espírito. Ele foi o filho querido dela, eu, a neta.
 A mudança nesses vinte e um anos que estou em pé foi inevitável. Hoje, infelizmente, me vejo na necessidade de um corpo ao lado. Não são apenas as tintas, os sons e os contos que me satisfazem, mas o sorriso e o calor tornaram-se elementos de sobrevivência. Por sorte, algumas características ainda me seguem. O estar sozinha por cinco minutos me levou até isso, pensamento em que o núcleo único é mais que necessário.

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